Museu Orgânico de Maria de Tiê reconhece importância cultural do Quilombo dos Souza

Além de ser reconhecida como Mestra na tradição da dança de coco e maneiro pau, Maria de Tiê foi titulada como Tesouro Vivo da Cultura do Estado do Ceará e Notório Saber em Cultura Popular.




Cultura, Tradição
Maria de Tiê (Foto: Augusto Pessoa)

Sinônimo de resistência, as comunidades quilombolas possuem identidade cultural própria e se formaram por meio de um processo histórico que começou nos tempos da escravidão no Brasil. O Quilombo dos Souza, localizado no Sítio Vassourinha, em Porteiras, no Cariri, representa muito mais que resistência. Trata-se da presença e da insistência por existir num sistema de apagamento de culturas e memórias do povo negro na região. E será lá que o Sistema Fecomércio Ceará, através do Sesc, vai inaugurar o Museu Orgânico Terreiro Cultural da Mestre Maria de Tiê, no dia 25 de agosto, a partir das 17h, integrando a programação da Mostra Sesc Cariri de Culturas.

Seráo 14º museu orgânico de uma rede de fomento à tradição. O de Maria de Tiê é um reconhecimento ao valor excepcional de integridade, autenticidade e universalidade cultural que o Quilombo dos Souza representa, explica o gerente de cultura do Sesc Ceará, Alemberg Quindins. Maria de Tiê, reconhecida como Mestra na tradição da dança de coco e maneiro pau, em 2019, mantém viva essa cultura, e, segundo Alemberg, o Museu Orgânico vai evidenciar a vivência da ancestralidade cultural de um povo através da arte dessas danças.

De acordo com a historiadora Regivania Rodrigues, acredita-se que a dança de coco tenha surgido por volta do século XVI, nas regiões agrestes, nas proximidades dos engenhos de cana-de-açúcar, surgida a partir das danças de umbigadas dos batuques africanos, que depois uniu-se aos versos e rimas sobre os afazeres cotidianos, produzidos pelos quebradores de coco nos trabalhos dos coqueirais. “É consenso entre estudiosos que a dança foi se transformando ao longo do tempo, a partir da interação entre as culturas africana e indígena”, explica.

Alemberg ressalta que o Sesc está em um processo de reconhecimento da Chapada do Araripe como patrimônio dá Humanidade, e espaços como o do Museu Orgânico Terreiro Cultural da Mestre Maria de Tiê são um exemplo de gestão participativa desse território cultural da bacia geológica do Araripe. “Então, reconhecê-lo é nos reconhecer como valores universais culturais da humanidade”, avalia.

Maria de Tiê: mulher negra e quilombola 

Maria Josefa da Conceição representa a quarta geração de mestres, que se iniciou com seu bisavô, Raimundo Valentim de Souza. Quando criança, gostava de brincar pelos terreiros, de roda e de casinha de folhas com as primas, relata Regivania Rodrigues. Casou-se com Jucier Mariano Dias, o Tiê, em 1986, ficando conhecida, portanto, como Maria de Tiê.

“Herdeira de uma liderança masculina, Maria de Tiê exerceu seu protagonismo feminino para chamar mulheres e homens de sua comunidade para o giro da dança, assumindo a honra de representar seu povo”, comenta a historiadora.

Além de ser reconhecida como Mestra na tradição da dança de coco e maneiro pau, foi titulada como Tesouro Vivo da Cultura do Estado do Ceará e Notório Saber em Cultura Popular, concedidos pela Secretaria de Cultura do Ceará e a Universidade Estadual do Ceará (UECE), respectivamente.

“O Museu vai trazer mais reconhecimento e chamar as pessoas para conhecer nossa história, a nossa cultura e a nossa tradição. Vai trazer coisas boas para o meu trabalho, para a minha história e para o meu povo. Tenho orgulho de dizer que sou mulher negra, quilombola”, afirma Maria de Tiê.

Quilombo dos Souza

Segundo Regivania Rodrigues, Raimundo Valentim de Sousa, conhecido como Raimundo Preto, foi escravizado e fugiu de uma fazenda no estado de Pernambuco. Atravessando os caminhos pela chapada do Araripe, alcançou um lugarejo, fixou morada, formou família com dona Ana e tiveram seis filhos.

Para os de casa, netos e bisnetos, Raimundo era o Pai da Rodagem, um homem de muitos fazeres e mestre de tradição, explica a historiadora. Ela pontua ainda que Raimundo Preto trabalhou na construção de engenhos de cana-de-açúcar e casas de farinha, foi marceneiro e mestre de brincadeiras populares. Identidades, saberes e fazeres que adentraram gerações e constituíram um território.

Reconhecido pela Fundação Palmares em 2005, o território do Quilombo dos Souza tem 330 famílias registradas e está localizado em Porteiras, alcançando ainda uma área que faz divisa com o município de Missão Velha, se estendendo pelas comunidades de Vassourinha, Vila Morais (Lagoinha) e Malhada Funda.

Serviço

Inauguração Museu Orgânico Maria de Tiê

Data: 25 de agosto

Horário: 17h

Local: Sitio Malhada Funda – Porteiras-CE